Passeio cicloturista a Sintra
Em Portugal, o tipo de passeio que vou descrever ainda é pouco praticado. As bicicletas que costumamos usar são alvo de olhares confusos e até de gozo. Sei que posso parecer um bocado insistente e até um bocado negativo na descrição de alguns encontros que tenho com alguns ciclistas, mas custa-me que ainda haja falta de alguma cultura da bicicleta em Portugal. E agora o ponto positivo. Se não há cultura da bicicleta em Portugal, porque não fazê-la nós mesmos?

Tinham-se passado meses desde a última vez que fui a Sintra, ainda mais com um passeio com amigos da Velo Corvo. Sintra deixa sempre, sempre saudades. Estava na altura de lá voltar.
Marcado o passeio e definido o ponto de encontro na fictícia casa de pasto “Ti Hipólito” (desculpa Rui, não fazia ideia que ainda existiam mesmo casas de pasto em Sintra), chegou a hora.
Ir a Sintra nos dias que correm é uma aventura. Sintra está agora cada vez mais transformada numa Disneilandia em que o mar de gente é uma constante. Demorámos cerca de dez minutos para sair da estação. Turistas confusos tentavam percebem como passar o bilhete nas infinitamente complicadas maquinetas portão CP. Vendedores de tours agitavam cartazes promocionais.
Reunido o grupo, estava na altura de começar a pensar em pedalar. Estava tudo bem disposto, como sempre. Cada um com a sua bicicleta. Umas vintage, outras não. O que não faltava eram sorrisos, felizmente.
Já sabia que tinham havido algumas alterações ao sentido de circulação na cada vez menos característica Vila de Sintra. Na volta do Duche, as bicicletas podem circular. Mas, e para nossa surpresa, depois do Palácio da Vila e começando a rampa da Pena, a subida teve de ser feita a pé- o sentido de trânsito tinha alterado. Fomos cuidadosamente informados por um agente da autoridade que teríamos de ir a pé até ser possível circular dentro da lei e não apenas até o polícia nos perder de vista. Como somos bem comportados assim o fizemos, até porque no próximo cruzamento, estava mais um polícia. Parece-me ser um uso sensato das forças policiais. Isso e permitir que todos os fins de semana subam centenas e centenas de carro Serra acima. Património mundial? Pois. Seguindo em frente…
A rampa da Pena foi palco de alguns Rallies de Portugal. Felizmente, esses tempos já lá vão. Agora o Rally é outro: é a subida dos Tuc tucs bem barulhentos , autocarros turísticos e uma fila de condutores domingueiros. Será que vêm alguma coisa?
Passando a parte mais movimentada da subida, chegámos ao cruzamento castelo/ Peninha. Virámos para a Peninha e parámos uns minutos. Rapidamente chegam mais ciclistas, estes montados em super bicicletas. Olham para nós com um misto de admiração, confusão e algum gozo. Dizemos bom dia e seguimos caminho.
A partir deste cruzamento, o trânsito é quase inexistente, e ainda bem. Depois do choque que é ver aquela multidão de gente juntamente com a continuada destruição da Vila, é bom sentir que estamos um bocadinho mais longe de tudo. O silêncio aumenta à medida que continuamos a subida. Começa o exercício de meditação.

Aumenta também o nevoeiro que rapidamente se transforma em chuvisco. Estávamos a pedalar dentro de uma nuvem, afinal de contas. No cruzamento dos quatro caminhos / Capuchos, cruzamo-nos com mais ciclistas confusos que parecem não entender como conseguimos chegar até aqui acima com “aquelas” bicicletas. O caminho, esse, continua.




Sintra tem o seu próprio clima. A temperatura desce e a humidade aumenta. Continuamos a subir para a Peninha. Por mais vezes que faça esta estrada, nunca me canso dela. A cada vez que vou, há algo novo a sentir. A zona da Peninha é considerada das mais mágicas de Sintra e hoje percebe-se bem porquê. Paramos aqui, quase sempre, para encher as garrafas de água e para comer qualquer coisa que trazemos. O picnic é a recompensa por ter feito esta subida lindíssima com os meus amigos. Conseguir juntar gente que, a partida seria tão diferente, em torno de algo tão simples que é ir pedalar é uma coisa linda. Todos nós adoramos bicicletas e bicicletas complicadas e especiais. Mas a bicicleta não interessa quando temos o que tivemos naquele dia em Sintra: uma linda experiência partilhada num local mágico. Será que aqueles que nos olharam com gozo conseguem sentir isto?
O frio começava a apertar, num dia de Verão. Estava na altura da longa descida até ao Guincho. Cerca de 10 kms, sempre a descer acompanhados de uma vista linda: o oceano, o cabo da Roca, a ponta da Europa. Começamos a descer com frio mas no Guincho estamos com calor. Olhamos para cima e vemos a Peninha, coberta de nuvens. “Estivemos ali em cima”, penso eu, enquanto me preparo para a parte final. Ciclovia até Cascais. O dia está lindo e o mar, esse, está com uma cor infinita.


Já em Cascais, terra de infinitos domingueiros, comemos um gelado. Estes pequenos hábitos que se tornam rituais fazem já parte de todos os meus passeios.
Para terminar o passeio, decidimos não apanhar o comboio para Lisboa, mas sim, pedalar até casa pela Marginal. Foi o final de um passeio que só pode ser descrito como lindo.
As fotos foram tiradas pelo Artur da Lisbon Cycling (https://www.lisboncycling.com/). O Artur é o melhor fotógrafo da cena das bicicletas e a página dele está cheia de bons artigos e boas fotografias. A primeira foto foi tirada pelo Ricardo. Obrigado a todos por terem vindo!
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